O superpoder do olfato na Alta Sensibilidade, e como recuperá-lo

O superpoder do olfato na Alta Sensibilidade, e como recuperá-lo

Segundo a Dra Elaine Aron — a psicóloga clínica que deu nome ao traço da Alta Sensibilidade nos anos 90 — as Pessoas Altamente Sensíveis (PAS) processam os estímulos externos e internos de forma profunda. Isto não quer dizer que os olhos vêm melhor, ou os ouvidos ouvem melhor, ou que o nariz cheira melhor, mas sim que aquilo que foi detetado é posteriormente processado mais intensamente a nível do sistema nervoso. Isto dá origem à alta sensibilidade a ruídos, ou a luzes fortes, ou a texturas de tecidos, ou a… cheiros! E cada PAS tem as suas próprias altas sensibilidades.

Na natureza o traço da Alta Sensibilidade já foi detetado em +100 espécies animais desde gatos, a cães, a peixes e até moscas. E na vida selvagem é fácil de entender que a alta sensibilidade pode constituir uma grande estratégia de sobrevivência.

Por exemplo, numa população de veados a pastar, todos escutam um estalido de um galho a partir-se. Mas só os 20% do grupo que é altamente sensível vai processar esse som de uma forma mais profunda, associar informações e deduzir: este som é um lobo a aproximar-se, FOGE! E alertar o resto da população que continuou a pastar como se nada fosse. É assim que a alta sensibilidade pode ser uma grande vantagem evolutiva.

Quanto a mim, uma das minhas altas sensibilidades sempre foi o olfato. E embora para certas pessoas haja uma sensibilidade maior a cheiros bons ou maus, para mim isso não se dava. Ou seja, o meu olfato sempre foi sensível a qualquer cheiro.

Se for um odor mau chego a sentir uma intensa repugna. Por exemplo, há tempos atrás deixei de conseguir comer couves-de-bruxelas (que eu adoro), que vinham embaladas em sacos de plástico. O cheiro que as couves absorviam do plástico tornou-se nauseabundo para mim.

Também os odores corporais (seja suor ou o cheiro dos pés) são tão intensos que tenho de agarrar nos sapatos de certos convidados e colocá-los na varanda (os sapatos, não os convidados).

Se entro num centro comercial tenho de afastar-me das lojas de perfumes, que me causam dores de cabeça devido à intensidade. De facto, sabias que na ilha de Vancouver (Canadá) há centros comerciais em que é interdito as pessoas entrarem com perfumes intensos? Tenho um amigo que vive lá e quando ele me comentou isso fiquei surpreendida. Ele é ainda mais sensível aos cheiros que eu, ao ponto de não conseguir deitar-se em lençóis recentemente lavados devido ao odor a detergente da roupa!

Por outro lado, os perfumes subtis da natureza como flores de laranjeira, ou de eufrásias, ou de rosas, são poesia em movimento para mim. Ativam-me diretamente a resposta do relaxamento e todo o meu corpo afunda numa serenidade de veludo.

A alta sensibilidade aos cheiros é chamada de hiperosmia e ao que parece pode estar associada tanto a fatores genéticos como a certas doenças (como enxaquecas, doença de Lyme ou distúrbios hormonais). As grávidas também desenvolvem por vezes um olfato aguçado durante o período de gestação.

Mas, na minha opinião, seria interessante fazerem um estudo sobre hiperosmia e PAS e investigar quantas das pessoas que possuem esta característica são altamente sensíveis.

Agora fica a questão: será que é possível treinar a capacidade olfativa? A resposta é um redondo SIM. De facto, é o que os perfumistas e sommeliers (profissionais do vinho) fazem nos seus cursos de formação.

E porque é que faço esta pergunta? Ora aqui está finalmente a razão deste artigo: porque depois de certas patologias traumáticas, certos tratamentos (ex. radiologia) ou infeções virais, as pessoas podem passar por um período de hiposmia ou anosmia. Ou seja, perda parcial (hiposmia) ou total (anosmia) do sentido do olfato.

Por exemplo, isto aconteceu a cerca de 40% de pessoas que passaram pela infeção de COVID-19 (!) Eu, como muitos outros, perdi o sentido do olfato.

Isto foi um grande golpe para mim. De repente, vivia num mundo sem cheiro. Nada. Nem bons ou desagradáveis.

O que eu considerava ser um superpoder meu, desapareceu num espaço de dias. Embora ao que parece há casos em que o olfato não se recupera devido à destruição de células associadas ao cheiro, geralmente o olfato pode ser readquirido. E, como terapeuta natural, não conseguia ficar de braços cruzados.

Se não sabes qual a tua pontuação no Teste de Alta Sensibilidade, clica no botão abaixo ou partilha com alguém o teste:

Então, como podes contribuir para recuperar o teu olfato? Que métodos podem aplicar-se no dia a dia que permitem treinar o cheiro?

Abaixo partilho contigo 3 fatores importantes a ter em conta que vão empoderar-te nesta jornada. Vamos lá!

  1. DE 30 A 60 DIAS, ATÉ 2 ANOS


    Segundo o Dr Leonel Luís, coordenador da Unidade de Otorrinolaringologia da Hospital Lusíadas Amadora, podemos regenerar as células do olfato em 30-60 dias, se atuarmos atempadamente. No entanto, existem casos que podem levar 2 anos até recuperação total deste sentido.

    Ou seja, quando reparamos que houve perda de olfato, é importante atuar o mais cedo possível de modo a iniciar-se a recuperação.

    No meu caso optei pelo treino do olfato como medida principal de atuação. De notar que existem pessoas que conseguem recuperar o cheiro de forma espontânea após uma infeção. Eu, muito sinceramente, preferi atuar em vez de ficar à espera de saber se me calhava essa “lotaria”.

    Também, se tens questões específicas sobre este tema, dirige-te a um profissional de saúde.

  2. TREINO OLFATIVO


    Este treino permite aumentar a sensibilidade do olfato e ajuda o cérebro a perceber os estímulos do cheiro. Estamos a recorrer à neuroplasticidade do cérebro (a capacidade de este se moldar com novas experiências) para recuperar o olfato.

    O processo consiste em cheirar uma gama diferente de odores a nível diário.

    Existem várias formas de fazer este treino. Uma delas envolve selecionar 4 odores familiares (ex. laranjas, alho, café e menta) e cheirá-los 2x ao dia, até recuperar o sentido do olfato.

    Segundo o Professor Philpott este treino permite recuperar o olfato em cerca de 6 meses.

  3. USAR ÓLEOS ESSENCIAIS


    Também podes usar óleos essenciais no treino olfativo. Nesse caso os mais usados são normalmente: óleo essencial de eucalipto + óleo essencial de cravinho + óleo essencial de limão + óleo essencial de rosa. Mas a verdade é que podes usar outros óleos essenciais.

    Por exemplo, no meu caso usei: cânfora + eucalipto + menta + ylang ylang (um dos meus óleos essenciais favoritos).

    Como fazer: aproxima cada frasco de óleo essencial ao nariz e inala durante 20 segundos, enquanto moves o frasco ligeiramente para a direita e esquerda para ajudar o cheiro a libertar-se. Isto é feito 2x ao dia para cada óleo essencial.

    Quem perdeu totalmente o cheiro deve esforçar-se por recordar o cheiro familiar aquando da inalação. Por exemplo, para mim a menta: recorda-me a canja da minha avó; a cânfora: o álcool de cânfora com que ela se massajava cada noite; o eucalipto: os eucaliptais onde costumo caminhar; e o ylang ylang recorda-me, bem…, o cheiro a ylang ylang que é bastante distinto.

    Para além disso, como higiene nasal usei o neti pot a nível diário. Se não sabes o que é ou como fazê-lo, vê este VÍDEO de 3 minutos no meu canal youtube.

    E se passadas uma semanas não sentes nenhuma melhoria, ou tens quaisquer questões em relação a este tema, consulta um profissional de saúde.

    No meu caso, após 6 dias de começar a fazer o treino olfativo juntamente com a higiene nasal, comecei a recuperar o olfato! Não sei se esse vai ser o teu caso, mas se és como eu, considero que meter as mãos à obra é sempre o primeiro passo.

“Agora que sinto amor,

tenho interesse nos perfumes.

Nunca antes me interessou que uma flor tivesse cheiro.

Agora, sinto o perfume das flores como se visse uma coisa nova.

Sei bem que elas cheiravam, como sei que existia.

São coisas que se sabem por fora.

Mas agora sei com a respiração da parte de trás da cabeça.

Hoje as flores sabem-me bem, num paladar que se cheira.

Hoje às vezes acordo e cheiro antes de ver”.

Alberto Caeiro, heterónimo de Fernando Pessoa

E tu, perdeste o sentido do cheiro alguma vez? Ou conheces alguém a quem isso tenha acontecido? Partilha na secção de comentários a tua experiência.

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Sofia Loureiro | BSc • MNat • PhD

Terapeuta Natural & Mentora de Pessoas Altamente Sensíveis • Autora • Palestrante

Especializada em Pessoas Altamente Sensíveis Certificação em PAS Nickerson Institute • Terapeuta da Dra Elaine Aron List

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2 thoughts on “O superpoder do olfato na Alta Sensibilidade, e como recuperá-lo

  1. Olá Sofia. Foi o que mais me afligiu quando tive covid, fiquei completamente sem olfato, eu que era uma pessoa que sentia o cheiro à distância, até conseguia identificar o perfume ou creme que a pessoa usava, como o filme do Al Pacino “Perfume de mulher” hehe. Foi um golpe duro para mim, levei 6 meses até o recuperar, e agora até acho que estou mais sensível e apurada no olfato que antes, mas confesso que também pesquisei sobre o assunto e reeduquei o meu cérebro para retomar o olfato, como cheirar certos perfumes ou óleos ou comidas e tentar identificar. Felizmente voltou à normalidade, mas o meu grande medo era- “será que vou ficar assim para sempre?” Felizmente que não.

    1. Olá Cátia
      Sim, eu também fiquei assustada. Quando nos primeiros dias do treino olfativo eu levava ao nariz os frascos de óleo essencial e não conseguia cheirar NADA, até sentia um aperto de medo só de pensar que poderia ficar para sempre assim. Mas graças ao mindfulness não desanimei. Passados 6 dias já tinha recuperado 40% do olfato. Senti-me tão feliz!
      Realmente não damos valor ao que temos até o perdermos…
      Beijinhos e obg pela partilha,
      Sofia

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